terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Sem Nem Saber

Sem nem saber, esperei. E o tempo tratou de me despojar dos adereços que eu recebera como dons e dádivas. O trato do tempo a decepcionar a fachada desta casa, perdas que eu relutantemente não queria, mas que aborto em concordância quando me olho no espelho e quando me fragilizo aos sinais impostos de uma vida cumprindo extenso contrato. Esperei em consternação o desfazimento do frescor da juventude, conhecendo a implacabilidade dos alicerces se desconstruindo, mas tratando de apreender essências, já que passamos a crescer por dentro e a ficar mais jovens de alma. Chego a colocar no forno um daqueles bolos amarelinhos para tomar com café, sob os odores quentes das minhas saudades de mãe um dia.
Hoje, venho te ofertar, amigo, minhas estórias acumuladas envolvidas em papel bonito, festa de desprendimentos e sínteses. Os meus olhos mais calmos e mais fundos; minha fala inteira e mais certeira; eu exposta sem medos de perdas, coração em transbordamento, reiterados direitos e vontades. Grande parte da jornada eu já fiz, ainda que tantas vezes por estradas tortas, estações tardias ou verdes que nem vi passar, eu passante ou expectante. Mas aqui estou, ainda que em tensas cordas de rabecas e violas a compor parcerias com trovões e vendavais nesse país cheio de chão.
Vim te ver, amigo, te auscultar o coração e mostrar o meu. Tentando ficar leve nos contos que carrego nos ombros, segurar meu caminhar sem me arquear ou curvar, mostrar no porte a realeza possível. Meu Brasil das manhas e trejeitos a me apontar impotência e engodos e eu ainda a procurar estradas, a repetir palavras e intentos, alimentos abstratos em papel bonito.
E te olho, estrangeiro amigo, a navegar esse rio grosso de perdões e esquecimentos, tão largo e intenso, águas densas apinhadas de embarcações e seus timoneiros, cada um absolutamente só. Os olhos de não saber se encontram e se perdem, embalados nos movimentos das ondas de bocas grandes. E navegamos ambos procurando em ânsia a terra de Shangri-lá, onde o tempo não nos despojaria dos dons e dádivas recebidos em berço.
Esperei e mais ainda aguardo até que os frutos da minha, da tua, nossas jornadas brilhem em madurez e suculência. O tempo em parceria a nos chamar baixinho e a gente a assistir ao giro do mundo. Calmos despojos e sínteses que já estavam escritos, amigo buscador das mesmas estradas, tanto tempo gasto para tão pouco entendimento. Mas a essência como lume, arde confirmando presença, a gente lendo bússola, desbravando e remando, cortando águas ou matas. Sonhamos corações escancarados sem o menor constrangimento e bem mais leves, olhos que se encontram e se perdem nas vagas várias.
Olha eu aqui! Tô passando, tô passante, tô mutante.

Inesneves, todos os direitos reservados.

domingo, 19 de dezembro de 2010

NOVAMENTE NATAL

No início a nossa fé é incomensurável. Sem rendições ou deserções sustentamos nossos projetos e crenças, olhos voltados para o futuro promissor e generoso.
E acreditamos. Colocamos sobre a mesa todas as nossas fichas, sem blefes. De nossos muito verdes anos sorvemos os deslumbramentos das apostas de fé que nos dão impulso e força. E nos sentimos prontos e preparados para a batalha e aprendizado que nos esperam.
No caminhar pelas estradas e encruzilhadas, projéteis e lanças nos são arremessados e nós, vulneráveis filhos da vida surpreendidos em nossa confiança já anunciando abalos, incorporamos nossos estados de fragilidade e tantas vezes de impotência. Machucados e doídos, ainda não nos deixamos abater, sabedores que somos de que o viver não prescinde de aprendizado duro. E sangramos.
Pode a história se dilacerar diante de nossos olhos mas nossos corações ainda ousam acreditar. Nos valemos dos nossos sonhos ou moinhos de vento, não importa, buscando nos sinais mais enigmáticos, os nossos passes para a felicidade.
Acendemos velas para as noites de Natal e também vestimos branco para receber em festa a cada ano novo que se alterna nos seus surpreendentes caminhos. Falamos no amor e na compaixão, trocamos abraços e presentes, fitas coloridas, brilhos e estrelas, os vermelhos verdes e brancos a compor cenários de sustentação de nossos sonhos renitentes. Com a mesma crença, ainda ansiamos. Não queremos antecipar as perdas que certamente virão, para que tenhamos espaço de viver o presente dessa vida matreira e este é o lema. Tempos acelerados que nem vemos passar. Deslumbramentos, apesar de tudo.
Está amanhecendo mais um Natal e nós celebramos o desfecho de meses vividos com a mesma força que nos impele ao desafio do viver dia após dia. Lá vem um outro ano em seu tácito compasso, mais um cometa em que nos dependuramos felizes e crédulos botando fé na sua jornada rápida e sedutora.
Depois é o pouso. Em irmandade e gentileza, descansar as armas. Fechar as gavetas das desilusões, arrumar os cantos do coração, limpar casas e quintais, incinerar mágoas e presunções. Literalmente queimar. Transmutar em cinzas o que não mais nos cabe e o que doeu. Renovar orações, acalmar cicatrizes, entender um pouco mais das reais idades
Nossa antiga fé inabalável, agora em vigília, sonda. Mas ainda acreditamos que a cada ano que acolhemos, podemos ser mais felizes e mais sábios, pretensos filhos da luz e do amor.
Aos que regam de estrelas e cores as sementes da paixão e fé, as nossas mãos em parceria; a cumplicidade disponibilizada, selada em timbre indelével e ainda sem deserções e rendições.
Nas casas do saber, entoamos hinos quase em sopro, tomamos do vinho da fraternidade, comemos do pão da vida e agradecemos. Por tudo que nos tem acontecido e por tantas lições incorporadas. Pelos caminhos percorridos e pelas estórias ainda por se cumprir.
O planeta em procissão a comungar dos desejos de paz, celebrando e ainda acreditando, filhos nômades de Gaia que somos. Ao final dessa imensa orbe de mendigos da luz, tochas acesas em busca de compreensão e tino, me incorporo e repito: Aleluia

Feliz Natal e um bom ano de 2011 aos irmãos de jornadas e buscas.